segunda-feira, 17 de maio de 2010

Direito administrativo no país da realidade

Aqui vai um possível caso prático, real, sobre assuntos de actualidade no nosso país.
O Jornal Expresso do passado sábado avançava uma notícia acerca da terceira travessia do Tejo:
"O governo vai avançar com o projecto de uma terceira travessia sobre o Tejo, «mantendo uma travessia rodoferroviária », avança ao Expresso o secretário de Estado dos Transportes Correia da Fonseca. Mas esta orientação não significa que este projecto se mantenha como esteve previsto até aqui. Pelo contrário. Mudará tudo, até porque o actual concurso vai ser anulado (...) o Governo (...) vai anular o concurso público lançado para a construção e concessão do troço de TGV entre Lisboa e Poceirão, onde o consórcio liderado pela construtora espanhola FCC. Segundo o Secretário de Estado dos Transportes, este concurso «será anulado devido a alteração das condições iniciais, técnicas e financeiras». Contudo nesta altura o Governo prefere não detalhar os argumentos que sustentam a decisão."
Este adiamento da terceira travessia, incluída no troço Lisboa-Poceirão (sem o qual a linha de Alta Velocidade Lisboa-Madrid é "inviável") acontece alguns dias depois do Ministro das Obras Públicas afirmar, na cerimónia de assinatura do contrato do troço de alta velocidade (TGV) Poceirão-Caia, que "resolvemos protelar a decisão sobre o modelo de construção do novo aeroporto", como noticia o jornal Público. Temos, portanto, uma suspensão de grandes investimentos, cuja fundamentação reside nas "dificuldades económicas e financeiras actuais", diz o Ministro das Obras Públicas.
Neste panorama, teve lugar no passado dia 8 deste mês a assinatura do contrato do troço de Alta Velocidade entre Poceirão e Caia, adjudicado ao consórcio Elos - Ligações de Alta Velocidade, co-liderado pela Brisa e pela Soares da Costa. O Presidente da República promulgou o decreto-lei que aprova as bases de concessão do mesmo troço no dia 13. Situamo-nos no domínio do Decreto-Lei n.º 86/2003, de 26 de Abril, que contém as normas especiais das parcerias público privadas, definidas no art.2º do mesmo documento.
No referido decreto-lei vêm enunciadas algumas razões que terão fundamentado a actuação do Governo: "pelo seu contributo para o desenvolvimento económico, coesão territorial e social e modernização do País, assegurando o estabelecimento de ligações à rede transeuropeia de transportes (RTE -T), elemento central da política europeia para o relançamento do transporte ferroviário, associado a valores de competitividade, eficiência e sustentabilidade, e que prevê a construção de cerca de 20 000 km de alta velocidade ferroviária interoperável em toda a Europa até ao ano de 2020 (...) Os estudos efectuados apontam para impactes económicos assinaláveis, em termos acumulados e num horizonte temporal de 30 anos, incluindo a criação de postos de trabalho a longo prazo e um aumento do investimento, do produto interno bruto e da receita fiscal. O desenvolvimento do Projecto RAV tem assim benefícios significativos para o País nos planos económico, social, de mobilidade e ainda ambiental." A Presidência da República, em comunicado, justifica a promulgação do DL tendo em conta que "o Governo comunicou que irá proceder à certificação por entidade independente da última análise custo-benefício realizada sobre este projecto", uma vez que "as informações recebidas não esclarecem todas as dúvidas". Vários economistas de renome, incluindo grande parte dos ex-Ministros das Finanças dos últimos 30 anos, estão manifestamente contra um tal investimento público.

Quid juris quanto à actuação do Governo nestas matérias?

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